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quinta-feira, 20 de maio de 2010

Entrevista Adelmir Morato de Lima sobre História Cultural e o Museu de Antropologia do Vale do Paraíba.

P - Pergunta de Cesira Papera.
R - Resposta de Adelmir Morato de Lima

R- Olha Cesira, primeiro é um pouco difícil e um pouco complicado relembrar tudo isso, agente conversou bastante sobre isso, não deixei claro, mas conversamos muito sobre isso; mas é assunto que eu tenho de entender de maneira geral. Eu acho que você está criando uma possibilidade muito interessante de eu dar uma forma a tudo isso. Acho que é uma história bonita, não é uma história só minha, é de um grupo de pessoas e uma história muito bonita, história acho que muito cheia de contradições, mas acho que, sobretudo é uma história muito cheia de violência né? Acho que relembrar tudo isso, é um pouco de minha dificuldade é de ainda relembrar de coisas, de atos de violência muito grande que foi cometido nesse processo todo que é uma coisa que deixou muita mágoa. Mas, acho que é necessário entender e acho que é importante dar uma perspectiva política a tudo isso, talvez a grande contribuição que você traz; porque eu já nem queria falar sobre esse assunto, é agente dar um sentido político porque não deixa de ser uma história pessoal de mágoa e uma história política, talvez seja essa a grande contribuição que você vem trazer.


Eu entrei meio por acaso nessa história da defesa do patrimônio cultural. Isso começou acho que mais ou menos no final da década de 70, eu entrei mais por acaso; havia um grupo de jovens de Jacareí que estavam pensando a possibilidade de criar um museu, mas um museu mais moderno com visão política dentro de uma visão ideológica de esquerda né? E a partir desse grupo acabei entrando né, no final da década, acho que mais ou menos 79, eu entrei participando de um programa que eles chamaram de museu de rua, era uma experiência muito nova, muito interessante onde se faziam painéis contando a história do município e esses painéis fotográficos eram colocados na rua então já se contém um primeiro paradigma aonde as pessoas iam lá como se fosse uma igreja, né um tempo onde as pessoas iam reverenciar uma história. Já produzidas pelos vencedores e a idéia nossa era exatamente o oposto, era pensar numa historicidade contada a partir dos vencidos e levar essa história para rua, e foi aí que eu entrei meio cambaleando, meio sem saber onde estava entrando; fazendo entrevistas, talvez um pouco parecido com o quê você está fazendo agora quer dizer, não com a experiência e conhecimento que você tem, porque a gente não tinha essa formação teórica, por exemplo, que você tem.

Então agente fazia as histórias, era a memória oral, basicamente que agente tinha o nosso objeto de pesquisa, e agente ia fazendo levantamento de histórias, ia produzindo esses conhecimentos e isso ia se transformando em textos bem sintéticos, bem escritos e tal e depois esse museu foi para rua, então as pessoas podiam comparar alguns edifícios antigos que tinham sido marcos importantes da cidade, que já tinham sido destruídos, então você mostrava a fotografia de hoje e contava aquela história, e foi uma coisa muito interessante, foi emocionante né? As pessoas verem aquilo e descobrirem que a cidade teve um passado muito rico, muito interessante e a partir disso surgiu um grande movimento. A idéia era criar o museu de antropologia, quer dizer, essa discussão, essa questão de que tipo, a característica que teria esse museu, já foi uma discussão ferrenha, porque se queria na verdade era continuar com o padrão de museus que era determinado pela Secretaria de Estado de Cultura, eles tinham um departamento lá chamado...acho que era Divisão de Museus, onde eles incentivavam os municípios a criar o que eles chamavam de museu histórico pedagógico. Então, em todas as cidades, mais antigas tinha um museu histórico pedagógico e botava o nome de um figurão da cidade, aí contava essa história oficial, tinha a galeria dos prefeitos, as galerias das autoridades e agente tinha uma aversão muito grande a esse tipo de coisa, então vamos pensar no Museu de Antropologia, se agente conseguir ter outros elementos nessa interpretação.

A história não é única, tem o outro lado dos vencedores, então nessa polêmica toda acabou prevalecendo a idéia de se pensar no MAVP. Quer dizer, esse grupo, ele já tinha começado o trabalho então não fui eu que comecei, esse grupo já tinha pensado.

Eu acho que o idealizador desse projeto foi o Osmar. Foi ele que pensou em tudo isso e eu entrei já no segundo momento imediatamente após se pensar nesse projeto; o Osmar saiu, já por divergências políticas né? E eu continuei, quer dizer eu continuei, mas continuei um projeto que ele já tinha pensado, quer dizer, o meu papel foi... com o tempo eu fui me encantando com esse projeto, com a idéia do Osmar.

Eu achei que o projeto era muito bonito. Eu acho que uma das características do Osmar é ter essa capacidade de enxergar 50 anos na frente. Ele sempre foi assim. Eu fui me encantando com esse projeto. O Osmar teve problemas políticos e se afastou e eu fui o fio condutor. Talvez por isso eu tenha ficado mais exposto politicamente né? Então muita gente começou esse projeto e depois parou. Cada um foi cuidar da sua vida e eu fiquei ligado a ele.

P - A maior parte das pessoas que estava envolvida nesse projeto estava ligada a esfera da administração ou existia trabalho voluntário?

R - Trabalho voluntário. A maioria das pessoas era voluntária. Pessoas que não tinham vínculo nenhum com prefeitura, não eram empregados não eram concursados. Era trabalho voluntário. Era até porque Jacareí não tinha, nem existia concurso publico naquela época. Pessoas da comunidade que se sensibilizavam com esse projeto e entravam de corpo e alma. Pessoas que se dedicavam, faziam pesquisas, faziam reuniões mais ou menos toda semana à noite, se entusiasmaram. Quer dizer foi um projeto, como diz bem o Osmar, quer dizer é um projeto que nasceu da comunidade, e o prefeito da época Benedito Sergio Lencioni, ele tinha identidade com esse grupo se identificava com esse grupo, então ele acabou trazendo essa idéia para... vamos dizer assim ele institucionalizou esse projeto aí ele se torna um projeto oficial.

P: Esse grupo tinha denominação específica?

Não, não tinha. Eram pessoas da comunidade que na verdade, tinham algumas afinidades, eu acho que essas afinidades eram muito mais ideológicas né, havia uma afinidade ideológica e acho que no final da década de 70, não tinha muito espaço de participação né, as pessoas não tinham muito que... Agente estava vivendo uma fase de acho que de abertura política, mas ainda na cidade do interior essas coisas não eram muito claras ainda e essas pessoas viam na possibilidade de um projeto cultural de reascender essa esperança, era a esperança da abertura política então, havia um clima, um desejo muito grande de que as coisas pudessem ser diferentes, que agente pudesse romper com os paradigmas antigos, esse clima de abertura de liberdade eu acho que aí agente entra com a história do patrimônio, entra exatamente nesse momento.

P - E você se lembra de alguns nomes além do Osmar, alguns nomes da época que trabalhavam próximas a você e ao Osmar?

R: Tinha muita gente assim que vinha, saía, vinha, ficava um tempo, mas acho que a Maria Lúcia Sant’Ana, é uma pessoa importantíssima nesse processo; o Osmar de Almeida, o Benedito Sergio Lencioni, que era o prefeito, haviam outras pessoas, a Alicia Nodherman, pesquisadora do INPE, e pessoas que sempre davam suporte. Havia uma pessoa que sempre dava suporte, havia uma pessoa que foi uma maestra nossa nesse processo todo, chamada Waldisa Russio Camargo Guarnieri, era uma museóloga ligada a Secretaria da Indústria em São Paulo e o projeto dela era o Museu da Indústria. Então ela tinha uma concepção. Era uma pessoa de um intelectual, muito bem articulada, né quer dizer ela era uma referência para agente, e ela trazia essa coisa viva de romper os paradigmas, num clima de romper as estruturas políticas, abertura política, uma nova proposta museológica, a história dos resíduos né, então ela foi um suporte teórico muito importante para agente. Ela foi um parâmetro durante todo esse processo, uma pessoa extremamente importante.

P - E é nesse momento que você começou a trabalhar na administração publica?

R - Bom, o Osmar tem alguns problemas políticos lá com o irmão do prefeito, ele saiu e o Osmar me convidou para dar continuidade ao trabalho dele. Aí o Osmar sai, acho que eu devo ter entrando em 1981, quando o Osmar saiu, já era funcionário da prefeitura, quer dizer não começou como funcionário; e eu fui incorporado a esse quadro, aí ele saiu e eu entrei, aí foi uma história longa né, eu fiquei acho que uns 13 anos.

P - Então você entrou já trabalhando nessa área?

R - Exatamente trabalhando dentro do museu. Porque o projeto inicial, qual era? Foi feito o museu de rua, se levantou uma série de coisas importantes e agente começou a pensar a questão do patrimônio, era muito mais amplo do que inicialmente agente imaginava, quer dizer não era só um museu de rua, recolher fotografias e entrevistar as pessoas. A partir disso começou a surgir uma série de outras indagações também e aí tinha o próprio prédio do museu que é por si só um objeto museológico importante, um edifício neoclássico de 1857 e havia o projeto de restauração desse prédio. E o projeto de restauração também já era uma área muito abrangente. Quer dizer, essa restauração tem que rever todas as intervenções, todas as épocas, quem morou, a própria história do prédio é a história do Vale do Paraíba também? Não é? E aí começaram a surgirem muitas outras oportunidades, quer dizer patrimônio cultural não é só preservar um prédio é ver a questão da arqueologia, a questão da cultura popular, a questão da construção do acervo, que tipo de acervo, ele é significativo, que tipo de acervo não é significativo, e tudo isso é uma escolha política, não é? Então Cesira, isso foi para a gente... Isso era um processo, (12:07) o Osmar estava lá fora, mas ele estava mais dentro do que fora; ele acompanhava tudo, tudo. Ele nunca deixou de fazer parte daquilo nunca, nunca. Ele nunca tirou o pé lá de dentro e nem a cabeça. Então para agente era um processo angustiante, porque agente estava numa época de abertura política e agente contestava tudo que era historia oficial, mas era para agente uma relação muito ambígua, quer dizer, como é que você estava dentro de um poder, um prefeito que tinha sido eleito, da ARENA; e agente propondo uma coisa nova, era uma coisa muito angustiante para agente quer dizer como é que agente conserva um prédio de um coronel da época do café, que foi escravocrata, se nos éramos da esquerda? Então era uma coisa de juventude mesmo, de dizer, olhar de separar coisas que às vezes não se separavam e agente queria fazer um corte que isso aqui era de direita isso aqui era de esquerda, e agente já viu lá na frente que as coisas estavam mais misturadas do que agente imaginava; que essa divisão era muito mais complexa e muito mais difícil né? Então acho que a restauração do prédio... Foi a primeira grande tarefa.

P - E todo esse processo foi administrado por você?

R - Não. Aí tinha a Maria Lucia Sant’Ana que era a museóloga, que era a pessoa responsável, tecnicamente era responsável, ela fazia o curso de museologia das primeiras turmas que estavam se formando no Instituto de Museologia de São Paulo e agente dava todo o suporte da formação dela; agente fazia os trabalhos agente ajudava ela, mas aí...

P - Aí nesse período a sua formação era? (13:60)

R - Não. Eu não tinha. Eu vim adquirir essa formação técnica depois, porque só havia o curso de museologia. E, na verdade eu só recebi o título muito tempo depois, quando a profissão de museólogo foi reconhecida no Brasil, quem já vinha um tempo atuando na área a comprovado, recebia o título de museólogo. Eu comprovei tudo, a minha passagem e tudo mais, na verdade eu nem requeri o diploma eu achei que não havia... Eu já estava afastado e tal, mas....

P - Então nesse período, como formação acadêmica você era?

R - Eu estava estudando ainda psicologia depois é que eu fui fazer o curso de patrimônio cultural na USP, um curso de patrimônio cultural, curso de especialização de patrimônio cultural que foram os primeiros cursos, depois eu fiz administração de cultura na Fundação Getulio Vargas que também foi a primeira turma.

Quer dizer, com o tempo é que foram surgindo essas coisas porque nem havia academia para isso; a preocupação com o patrimônio cultural ele não tinha essa preocupação acadêmica era muito raro né, depois é que começaram a surgir esses cursos, foi então um processo e no meio do caminho foi se embasando teoricamente.

P - Então o Museu de Antropologia do Vale do Paraíba se formou enquanto uma necessidade abrangente de... vamos dizer, de um espaço cultural, de criação de uma mentalidade...

R - Criação de uma mentalidade. Não era só o projeto do museu; e é interessante pensar isso hoje, não foi só no museu. Acho que talvez essa seja a grande percepção do que eu estou começando a ter hoje quer dizer, aqui era um espaço físico onde um grupo de jovens que sonham com abertura política, que desejam se expressar, desejam criar coisas novas, desejavam ter uma atuação social e encontraram naquele espaço, uma possibilidade de realização do sonho, então não era só o museu tanto que se agregam a esse discurso a questão da ecologia, muito da questão dos partidos de esquerda do município que havia uma identificação muito grande com o próprio PT, que tinha uma identificação muito grande com esse projeto e acho que aquele espaço era reconhecido como espaço de atuação de esquerda, de história reconhecida. (16:17) Agora o que era mais interessante de tudo é que era um prefeito da ARENA, né? Era um prefeito da ditadura militar. E é interessante agente observar hoje é que ele tinha uma tolerância muito grande com relação a esse grupo. Ele tinha uma tolerância grande, o que a gente vê depois lá na ponta quando essa abertura política se consolida e tudo mais, que as pessoas que eram da esquerda na época que se posicionavam de maneira ferrenha contra tudo que era da direita e tudo mais, elas passam a ser extremamente intolerantes e a rejeitar com muita violência esse grupo. É uma coisa muito estranha.

P - Praticamente deu origem à essa discussão que...

R - Que deu origem, que impulsionou a discussão no partido, que canalizava os anseios da sociedade, que sonhava com espaços públicos como possibilidade de implementação e projetos sociais, de interesse popular, etc, etc, etc; depois eles se identificam com isso, crescem com isso e quando assumem o poder, negam a existência de tudo isso, até porque parece que os interesses eram outros né, a gente vai perceber isso depois. (17:30)

Mas, acho que a sua pergunta para mim é a chave de tudo isso. É a chave; então não é a história do museu, é a história talvez de uma mentalidade. História de um grupo de jovens que dentro de um cenário político;... é importante a gente entender que cenário é esse que aconteceu no final da década de 70, início dos anos 80 abertura política, sonho de liberdade, desejo de participação social, articulação do discurso que se dava muito em torno da participação popular e aquele projeto, aquela idéia do museu era o que estava, era o que possibilitava essa expressão, e tudo que era pensado nessa questão do museu era pensado do ponto de vista ideológico. (18:07) Se você constitui um acervo e coloca dentro de uma casa, cada objeto que tem ali é da história de um vencedor e de um vencido, então a gente tinha um critério, aliás acho até que era excessivo, porque hoje penso algumas coisas de maneira diferente, mas agente tinha um pavor na possibilidade de pensar que esses objetos fossem testemunhas da história dos vencedores . É claro que nisso é muito mais complexo lá na frente agente vai ver que não é tão fácil. A história é mais complexa do que isso.

P - Depois foi um outro prefeito Osvaldo da Silva Arouca, que conseguiu concretizar o projeto de restauro?

R - É, mas só que antes de Arouca, teve um, se você pegar aquele artigo da revista de museologia, aliás, aquela foi a 1° revista de museológica do Brasil. E eles tinham um respeito tão grande pelo que se pensava em Jacareí, era um laboratório, era uma experiência com relação à área de patrimônio cultural, que a Waldisa que era uma pessoa intelectual da área das academias, ela via naquilo uma experiência fantástica. Ela achava que dali surgiriam novos parâmetros para pensarmos a sociedade. Aí você começa com Arouca.

P - E você me disse que antes disso, antes do término do restauro existiu uma ação da Waldisia, da museóloga.

R - Aquele artigo que está escrito na revista de museologia, aliás, só falando um pouco dessa revista ela foi a 1° revista de museologia feita no Brasil e eles dedicaram e pediram para eu escrever um artigo grande sobre a história do museu e por quê? Porque a Waldisa, ela achava que o quê se fazia em Jacareí era um laboratório muito interessante; que aqui se pensava a questão da museologia de maneira muito original, peculiar. Ela achava que a gente rompia com esse paradigma de museozinho histórico tradicional, e tudo mais. Então acho que foi uma grande homenagem que ela fez para agente, quer dizer, no Brasil inteiro você escolher uma cidade do interior e contar essa história, então ali é um pedaço daquela história e o que se segue depois. Esse prefeito o Bene, ele sai e entra um outro prefeito que era mais identificado com as idéias de esquerda, mas que também não traz muita contribuição para esse processo. Quer dizer eles não conseguiam pensar essa idéia de patrimônio cultural como política pública, então as coisas ficavam muito em idéias muito etéreas muito: “Precisamos preservar isso, é muito bonito; isso é importante”; mas não destinava recurso público: X% do orçamento vai para a restauração do prédio, vai para a preservação do patrimônio histórico; vai para mancha urbana, aquela área central da cidade onde estavam os edifícios antigos, e isso não se transformava em recurso financeiro, então não havia uma política pública, e isso foi uma coisa terrível porque agente continuava sonhando, continuava pensando, fazendo projeto, mas não tinha recurso financeiro.(21:50)

P - Você tinha um grupo de pessoas consistente nesse período que te acompanhava em decisões , ou programações?

R: Não Cesira. Oficialmente tinha eu como funcionário, tinha mais dois funcionários auxiliares, mas de quem eu tinha apoio era só das pessoas de fora. O museu continuava uma pessoa só oficialmente de dentro um grupo de pessoas que continuava ajudando, contribuindo, torcendo, levando informações, chegaram a criar a Sociedades Amigos do Museu que era uma maneira de você fazer pressão política sobre o prefeito para que isso se tornasse recurso financeiro.

P - Por que, as verbas para o museu vinham só da prefeitura? (22:28)

R - Só da prefeitura, as verbas eram escassas, mínimas, mínimas...

P- Era através da Secretaria de Educação ou o Museu era autônomo?

R - Não. O museu na verdade é..., ele era ligado vamos dizer assim... oficialmente ele era ligado a Secretaria de Educação mas politicamente éramos separados. Não havia interferência entre a educação e esse museu, porque a idéia era se criar uma fundação para se administrar o museu; então na verdade era um espaço meio solto dentro da administração que ninguém queria: “O prédio não cai porque eles ficam olhando lá”. Então a gente se tornou um pouco vigia daquele espaço já que não tinha recurso financeiro.(23:45) Tinha um projeto de restauração definido, muito bem definido, muito bem feito, muito bem elaborado, né... mas não tinha recurso financeiro. Aí é uma fase terrível, muito angustiante também porque chovia, caiam paredes, não rinha recurso financeiro não é?... E isto não se transformou em política publica, até que mais ou menos no final do governo do Thelmo Aldemir Cruz se cria uma Fundação Cultural, mas na verdade era uma fundação para administrar o Museu; não era uma fundação que fazia teatro e tinha outras atividades culturais. (24:21) Uma fundação para administrar o Museu que continuava não tendo recurso financeiro. Então este foi o grande problema, nunca se transformou numa política publica, nunca! Era um sonho que estava escrito no papel, mas quando você pega recurso financeiro era insuficiente para manutenção do próprio prédio quanto mais para o restauro.

P - Trabalhava ali na época, você e o historiador Sávio?

R - Não. Essa época não. Depois eu começo agregar algumas pessoas à esse projeto. Alguns historiadores; agente fazia contratações temporárias porque eles não queriam abrir o concurso publico, eles não queriam montar uma equipe técnica e aí eu achei interessante observar porque na verdade esse projeto era muito, tinha identificação de pessoas que pensavam muito diferente, isso estava muito evidente, né? Então não era muito interesse que se aplicasse recurso financeiro a esse trabalho aparecesse de alguma maneira, não havia, claramente não havia esse interesse, então o máximo que agente fazia era contratar historiadores, antropólogos, e nesse período curto que eles eram contratados eles produziam algumas pesquisas historiográficas, faziam um trabalho muito interessante, então era um trabalho de formiguinha, coletava aqui, coletava ali, coletava acolá, com pouco recurso; agente comprava acervo basicamente no começo, foi acervo de arte popular, agente chegou a fazer levantamento em toda região do Vale do Paraíba sobre... reunimos um acervo muito rico sobre arte popular é... eu acho que na época agente produziu um documentário muito interessante sobre os pintores populares os chamados pintores primitivos e isso saiu inclusive um livro em edição bilíngüe. (26:25) Não havia vídeo naquela época, então fizemos um áudio visual que inclusive ele foi selecionado na época lá na USP para representar o Brasil no Canadá, então quer dizer com toda as faltas de recursos agente conseguia produzir coisas dentro daquela linha de originalidade, burlar todas as dificuldades, todos os problemas, a gente conseguia ter um produto cultural; na bacia das almas! Esse trabalho tinha esse reconhecimento, e não tinha reconhecimento só da cidade, mas de todas as instituições culturais. Eu me lembro que a Folha de São Paulo fez um artigo muito interessante elogiando o trabalho que agente fazia aqui em Jacareí.

P - O encaminhamento desses projetos, eles passavam pelo crivo do administrador público, ou de algum assessor direto do prefeito?

R - Não passava. Eles não davam dinheiro e deixava agente ficar à vontade lá, então o que agente fazia, corria atrás de empresas, conseguia dinheiro e fazia livros de arte, conseguia dinheiro por fora, por doações agente conseguiu comprar o acervo de arte popular.

P - Era uma auto gestão praticamente do próprio museu sobreviver. Era uma auto gestão?

R – Exatamente, era uma auto gestão; a sociedade amigos do museu arrecadava um pouco de dinheiro, financiava às vezes viagens que agente tinha que fazer.(27:40) Financiava a confecção desses documentários que agente fazia sobre os artistas. Então era uma coisa assim que, é: ”Deixa eles lá, deixa eles lá” E agente se virava na medida do possível.

P - E esse período é em torno da década de 80?

R - Acho que é final da década de 80. Não sou muito bom para data, mas acho que é final da década de 80, então criaram, oficializaram uma fundação; então havia uma instituição, a lei votada na Câmara. Fundação que administrava o Museu que tinha objetivos muito nobres tal e que se for você olhar não tinha funcionário, quer dizer tinha eu, né! Tinha eu e dois funcionários da limpeza. Quem mantinha aquilo tudo eram as pessoas que estavam fora da prefeitura.

P: E não existiam diálogos? Diálogos com administração ou com a assessoria. E o legislativo, como que se comportou até esse projeto, até esse período que você descreve. Qual foi a posicionamento do legislativo com relação a isso, com relação ao Museu; ou aos projetos que deveriam ser encaminhados pelo Museu?

R - Acho que eles viam com uma certa estranheza, quer dizer meio complicado falar de patrimônio cultural, falar de museologia, isso era conceito totalmente desconhecido desse povo, eles não davam muita importância para isso, eles achavam meio exótico um bando de estranhos. Eles não entendiam por quê o Museu não acabava nunca, um restauro que não... Não acabava porque não tinha recurso financeiro, mas também não acabava porque não tinha recursos financeiros; mas também, nunca ninguém chegou lá, falou: “Vamos votar, vamos aumentar essa verba”. Eles não sabiam o que é que agente fazia, eles não tinham noção disso, era uma coisa muito elementar, muito... quer dizer não mudou o perfil da Câmara né? (29:30) Não mudou nada; eles na maioria, um rol de sessões com gente ignorante, estúpida, que não sabia de nada e que não tinha muita importância; quer dizer aquilo não era uma área de interessante deles. Não tinha nenhum, quer dizer, como era o dialogo com a administração, com o prefeito Thelmo. Não dava recursos financeiros; acho que a resposta esta dada, né? Acho que a mulher dele é quem tinha um pouco mais de interesse, mas um pouco mais na frente ela vai se tornar inimiga número um desse projeto todo, né?

P - Em algum momento ela demonstrou um interesse?

R - Ela demonstrou interesse sim. Ela tinha uma sensibilidade maior para essa questão. Aparecia pouquinho de recurso financeiro que foi muito mais por iniciativa dela e não do prefeito.

P – Da Sonia Bonano?

R - Então se se conseguiu fazer algumas coisas, trocar o telhado, fazer o piso, quer dizer algumas coisas foram feitas, mas por sensibilidade dela. Acho importante agente ter claro que não havia uma política publica. (30:52)

P - E ela estava na esfera administração do Museu ou não?

R - Não. De maneira nenhuma. Ela estava mais no Fundo Social de Solidariedade, era uma coisa que ela se identifica, às vezes ela exercia alguma influência no marido para que saísse algum recurso financeiro para a fundação, mas isso não é uma política pública, então quer dizer eu acho que é um aspecto interessante dessa história, você vive da gratidão né? Do político “Agora sim”, “Agora esquece”.

P - A possibilidade ou a sensibilidade de quem tem a influência junto ao político, de sensibilizar ...

R - Exatamente. De alguma influência de alguém que se sensibilize em algum momento e diz: “Vai lá da um pouco de grama lá” e diz “ não deixa o prédio cair”. Então vivíamos dessas migalhas o tempo inteiro.

P - Visto que o Legislativo também não tinha possibilidade de diálogo.

R - Não tinha, porque não tinha interesse, não reconheceu isso como uma coisa importante para cidade.

P - Nesse período já tinha se iniciado um movimento em termo de defesa de patrimônio?

R - Eu acho que ampliou mais acho que se ampliou um pouco mais esse grupo aumentou com a criação da Sociedade Amigos do Museu; eu acho que agente tinha um grupo de pressão política, mas o problema é que esse cada vez mais esse grupo se identificava mais com os grupos de esquerda, quanto mais ele se organizava fora, mais por dentro eles diziam não! Então ele crescia fora, quer dizer a pressão, carta para imprensa, denúncia na imprensa. “Esta chovendo ali dentro do Museu e ninguém faz nada. O museu está largado!” Não tem recurso financeiro, né? Havia essa pressão, ela foi aumentando, quer dizer aumentava a pressão cada vez mais quer dizer, a minha situação ali dentro ficou mais difícil, porque eles achavam que eu era porta voz desse grupo, então porque eles iriam colocar recurso financeiro, né? Se esse grupo era identificado com outras ideologias?

Essa era uma briga um pouco freada, né quer dizer ninguém estuda isso de maneira clara, mas todo mundo sabia.

P - Você em algum momento se sentiu ameaçado com relação à sua função, ao seu emprego, trabalho?

R - O tempo inteirinho, o tempo inteirinho era andar em um fio da navalha o tempo inteiro havia pressão da câmara municipal para minha demissão, havia pressão muito grande porque eles diziam: “esse rapaz é de esquerda. Isso é um absurdo, aquilo é um antro de gente de esquerda. Eles ficam fazendo reunião até altas horas da madrugada”. Como se agente tivesse o grande poder de mudança, né? Então eles achavam que aquilo era um antro de esquerda eles falavam isso! Talvez esteja aí uma das explicações para não dar recurso financeiro “Vamos matá-las a mingua”.Mas acho interessante essa coisa bipolar, quer dizer você tem uma instituição oficial sem dinheiro, sem recurso nenhum, sem política pública definida e um grupo da sociedade exigindo que eles tomem providência, então eu no meio da história, tentando equilibrar; então algumas coisinhas foram feitas no governo do Thelmo, mais por iniciativa da mulher dele. Ela é uma pessoa mais sensível à área cultural. Bem, aí ele sai entra o outro governo do Oswaldo Arouca, aí a coisa toma um rumo meio diferente.

P - Mas toma um rumo diferente por quê?

R: Porque quem passa a presidir a Fundação Cultural é a Ada Arouca, aí você tem uma pessoa com uma formação intelectual muito f..., muito consistente. Uma boa formação filosófica. Aí você senta, deixa rola, né? Aí você conversa, aí você tem uma dimensão aquilo, quer dizer ela entendeu o quê agente queria ela se identificou com aquilo que agente queria Ela se identificou com aquilo que agente queria.

Aí o que acontece? Quer dizer ela entendeu o que agente queria. Ela se identificou com projeto que ela já conhecia.

P - É a professora Ada Cherubini.

R - É a Ada Cherubini Arouca, aí o que acontece, ela diz... não! Quantos anos vocês estão lutando para restaurar esse prédio, há quantos anos? Então nós vamos fazer isso!

Aí o que acontece, começa a aparecer recursos financeiros, aí começa à aparecer a questão do patrimônio; aparece como política pública. Não sei quantos milhões de reais que eram destinados por ano para desenvolver esses projetos, aí se transformam, pela primeira vez aí agente tem recursos financeiros para implementar essas políticas e aí a coisa toma dimensão extraordinária ela torna dimensão extraordinária. (35:20)

P - Mas era esse objetivo quando foi criada a Fundação, na administração anterior do Thelmo, foi criada a Fundação, era esse o objetivo?

R - Era esse o objetivo, porque essa fundação administra...

P - Mas a fundação, como aconteceu o processo da efetivação da fundação como ela foi efetivada, em que termos ela foi discutida, em que âmbito da esfera do poder ela foi discutida, foi discutida entre vocês e a Senhora Sonia Bonano que tinha sensibilidade para perceber que tinha necessidade de uma institucionalização para o museu? (36:05)

R -Não... Esse trabalho saiu desse grupo, o Osmar; Osmar foi uma pessoa que ajudou a desenhar esse estatuto. Eu, quer dizer... todo esse grupo quer extra oficial, agente compôs agente desenhou esse estatuto.

P - Da Fundação Cultural de Jacareí?

R - Não essa fundação que tem hoje. Da fundação que administrava o Museu. Nós fizemos o estatuto e a Câmara aprovou e ficou lá, não se cumpriu. Quanto a Ada Arouca entra, ela diz, “Não vamos dar recurso financeiros, vamos transformar isso em Política Publica”. Aí começa a surgir o orçamento, né. Aí você contrata uma empresa, faz processo de contratação, uma empresa especializada. Executa todo o projeto de restauração e aí começa a surgir coisa um bem muito interessante. Quer dizer, talvez Cesira, uma das coisas mais importantes é que toda atividade que agente fazia era sempre uma possibilidade que agente tinha de ensinar as pessoas, de envolver as pessoas no projeto, é uma das condições que agente exigiu da empresa que fez o restauro é que boa parte dessas pessoas que fariam a restauração de pintura, as restaurações mais delicadas fossem contratados em Jacareí.

Então vinham os técnicos, mas boa parte com o pessoal era treinada aqui em Jacareí e uma dessas meninas a Maria Luiza Recco, que trabalhou no restauro dessas pinturas que tiravam doze, treze camadas de tinta até chegar na pintura original; essa menina hoje ela mora em Paris e ela trabalha com um dos maiores restauradores do mundo, eu não lembro o nome dele e eu sei que é grande especialista em restauração de arte Egípcia. Ele trabalha para o Museu do Louvre e a Maria Luiza trabalha com ele, ela é daqui de Jacareí.

P - Iniciou o trabalho aqui?

R- Iniciou aqui, a paixão dela começou aqui, aí surgiram uma serie de outros restauradores de cerâmica, que hoje estão na Espanha. Vários deles seguiram essa linha. Aí bom... tem recurso financeiro, tem dinheiro, foi feita toda a restauração do prédio, foi fantástico, foi muito bonito, toda a restauração. Se pensou em espaço de atividades lá dentro, se montou um auditório muito bonito, porque a idéia era que aquilo fosse um espaço de discussão de se pensar o Vale do Paraíba. A concepção: um museu que pensasse o Vale do Paraíba, a realidade do Vale do Paraíba; que discutisse o passado, mas que se discutisse a realidade também.

Era um grande fórum de debates para se pensar o Vale do Paraíba, então se montou o auditório.

P - Esses espaços criados ali dentro tiveram uma predominância do quê vocês imaginavam para o museu ou teve um projeto museológico distinto que especificou a criação daqueles espaços como o auditório, como a sala de aula que trazia as memórias do “Grupão”?

R - Não. Tudo foi pensado, e mais uma vez esse grupo, fora do poder público, ele estava separado do poder publico, eles estava separado do poder publico! Então era o que, que tipo de Museu nós vamos fazer? Essas idéias surgiram das pessoas, que uma das coisas que predominou, é que as pessoas opinavam.

P - Você conseguiria fazer agora uma viagem pela casa me descrevendo os cômodos; como vocês imaginaram de utilizá-los e a conotação que tiveram depois de prontos. Começando do lado direito, começando pela sala das memórias.

R - Bom, a primeira preocupação que agente tinha era na entrada da casa, era que tivesse, respeitasse toda a suntuosidade da casa, que a arquitetura falasse por si só, que agente não queria muita interferência, poluição visual. O que agente discutiu com a empresa de restauração é que no processo de restauro agente deixasse marcas de outras épocas. Isso ficou, isso foi uma coisa legal. Bom, do lado direito tinha, nós reconstituímos uma sala de aula de aula e esse foi um dos pontos talvez mais fortes do projeto do museu, porque o prédio Solar Gomes Leitão funcionou como escola, escola pública durante muito tempo, acho que desde o começo do século XX. Ele funcionou como escola, então a referencia que a cidade tem do prédio, não é a referencia neoclássica, essa é uma visão mais dos intelectuais, dos arquitetos. Para a cidade aquilo é uma memória afetiva: “É ali que eu estudei, é ali que eu comecei minha história de vida”.(41:2)E agente ouvia muito disso: “ ah eu lembro disso, eu lembro daquilo” , aí o que agente percebeu; em uma das reuniões com várias pessoas, até que uma pessoa disse: “Ah, o que vamos colocar? É só ouvir o quê às pessoas estão dizendo para agente”. Quando as pessoas chegam aqui o que é que elas falam? Quando elas entram no prédio o primeiro lugar que elas querem descobrir é o lugar que elas estudaram, então isso é uma memória afetiva. Então falamos, então é isso. Então quer dizer as próprias pessoas que freqüentavam a casa já deram uma pista para agente. Então fomos atrás de todos os materiais, as cartilhas da época, aí agente colocou cartilhas de períodos diferentes, porque o público era imenso, quer dizer desde o começo do século XX, então foram varias gerações que passaram por ali e então agente reconstituiu uma sala de aula, com livros de épocas diferentes porque em algum momento você ia se identificar com sua época, às carteiras reconstituímos os sons das salas de aula, foi uma coisa que fez um sucesso muito grande; o som de crianças subindo escada, que eles se referiam muito, aí o que, que nós fizemos; nós começamos a ouvir melhor o quê que as pessoas... “O que é que te lembra essa escola? Ah! eu lembro do som da escada, eu lembro da hora do recreio, eu lembro do barulho do sinal, sai na hora do recreio”. E agente reconstituiu tudo isso, tudo, tudo, tudo. (42:50) Então as pessoas sentavam tinha uma iluminação muito interessante bem adequada, tinha um sistema de som todo muito bem projetado. Então as pessoas sentavam na carteira e ficavam ouvindo esse som. Então aquilo causou uma verdadeira comoção. Então você veja, um projeto de extrema simplicidade as pessoas que sentavam ali e a idéia era preservar a memória afetiva das pessoas, a história de cada um então essa a primeira coisa. (43:20)

P - Criando um elo de ligação com aquele prédio que inicialmente era do Coronel João da Costa Gomes Leitão.

R - Justamente era de um coronel. Não era reconstituir a casa do coronel, mas era, mas era um pouco da história da casa, história dos comuns né? De todo mundo que passou por ali. Então foi reconstituída essa sala de aula, isso mereceu muita matéria em jornais, no Estado de São Paulo, a Folha de São Paulo. Isso circulou muito no Brasil inteiro. Foi um projeto muito copiado também. Muita gente procurou agente para saber como agente tinha pensado aquilo. E um projeto de extrema simplicidade.

P - Ele surge em Jacareí como uma inovação e ele se expande, a idéia desse Museu não fica em torno desse grupo de pessoas que pensavam ao museu, nem em torno do prédio e nem em torno de uma administração que não sabia bem o que fazer com esse patrimônio, e essa idéia teve autonomia; ele cresceu.

R - Ela cresceu. Ela cresceu, ela cresceu, de repente cresceu é... Eu me lembro, me lembro de um artigo uma vez que saiu, acho que saiu no jornal, acho que foi na Folha de São Paulo não sei se ainda se acha essa matéria, se chamava Primitivos e Valentes em Jacareí. Primitivos porque era uma exposição que agente tinha de pintores primitivos e ela falava, a Haddad Abraão que era uma critica de arte, sobre a valentia de pessoas que trabalhavam sem (44:24) recursos financeiros; que ela não conseguia entender como produzia tantas coisas interessantes e rompendo coisas que ninguém via, ninguém tinha visto um museu daquela maneira. Bom,... ai voltando, reconstituição dessa sala que foi uma das melhores coisas que foi feita, depois do lado esquerdo ali foram feitas muitas coisas ali, foi arqueológico ali, (45:31) tinha uma sala de materiais de arqueologia, aliás, o capítulo de Arqueologia é uma (45:36) história a parte; com arqueologia depois você encontrava ali um corredor embaixo, onde nos transformamos em um bar, era uma idéia muito interessante que o museu fosse um ponto, continuasse a ser um ponto... Ele já era um ponto de encontro, o que agente queria (45:55) fazer com aquilo na verdade era dar uma situação mais agradável, um café, ou fazer um bar, fazer com que aquilo se tornasse um ponto de encontro que circulasse idéias ali, e foi (46:08) uma coisa muito interessante, uma coisa muito legal que deu um resultado extraordinário. Tinha espetáculos de Jazz, de Bossa Nova de instrumentistas, pessoas maravilhosas, de muitos pianistas jovens do Vale do Paraíba se apresentaram ali. Era uma (46:30) loucura, quer dizer, era uma loucura, estava se transformando em um negócio... E... Cresceu tanto que eu acho que agente não tinha muita dimensão de onde é que ia parar tudo isso. Depois, no fundo tinha a parte de... Tinha uma parte onde agente mostrava a taipa, (46:48) como é que foram as técnicas de intervenção no prédio que era uma parte maior, tinha a parte administrativa, como não tinha muita parte técnica, quer dizer eram poucas né? Depois agente subindo, tinha o Auditório um grande auditório muito bem montado, agente teve a preocupação de montar este auditório sem ferir o madeiramento, depois eles, depois eles desmontam esse auditório e montam em outro lugar e dizem que criaram um teatro em Jacareí. (47:14) Depois tinha nas outras salas tinha uma grande exposição, uma imensa exposição sobre arquitetura. História da arquitetura do Vale do Paraíba e acho que essa exposição foi uma das mais importante que agente fez; ela teve a curadoria do Dr. Antonio Luiz Dias de Andrade era do IPHAN – Instituto Patrimônio Histórico Artístico Nacional. Era, era a única pessoa que tinha um levantamento de todas técnicas construtivas no Vale do Paraíba. Ele levou muito tempo, acho que levou mais, quase dois anos para montar essa exposição.

P - Com o material dele? (48:00)

R - Com todo material, o que faltava ele montou uma equipe com estudantes novamente o gancho: “nós queremos que você pegue estudantes de arquitetura do Vale do Paraíba para ajudar a montar essa exposição, a pesquisa e tal. Então se formavam grupos extraordinários de estudantes. Era uma algazarra, aquele povo. Era muito interessante.

E aí eles foram pesquisar fazer todos levantamentos das fazendas de café, outras técnicas construtivas mais rudimentares, das igrejas; então nós montamos uma enorme exposição, uma exposição muito bonita foi feita inclusive um documentário também. Eu acho que basicamente é isso; quer dizer, tinha outra sala que nós usamos do acervo de arte popular. Que nós levamos mais de três anos coletando a produção de arte popular em toda a (49:02) região do Vale do Paraíba. A idéia é que agente, é que as pessoas ao entrar naquele prédio tivessem uma noção clara do que se produz em termos de arte popular da arte figurativa e de arte popular de artesanato, de bom artesanato, artesanato que tenha habilidade manual. Então acho que foi uma coisa muito rica, muito interessante. (49:15)

P - E esses materiais utilizados para vocês conservavam ou era sempre devolvido para quem fornecia?

R - Não esses aí eram acervos. Tinham as alcovas também, que agente transformou em reserva técnica, né? Não era o espaço adequado porque a idéia como tinha crescido muito o projeto do museu, a idéia era que fosse desapropriada a área em volta, que se fizesse jardins em volta, aí agente já estava unindo um outro conceito, né? Que era questão da cultura e lazer.

Agente acha que essas coisas poderiam conviver juntas, né? Era fazer grandes jardins em volta do museu, espaço de lazer, feira de flores no final de semana, e ser um ponto de encontro também. E aí você faria uma reserva técnica à parte, né? Porque o prédio não tem muitas condições técnicas para abrigar acervo. É uma condição complicada. Tem um trânsito muito complicado na frente do prédio. (50:16)

Mas para isso foi feito um estudo muito interessante, do impacto que causaria o trânsito; olha naquela época há quantos anos, há mais de 20 anos atrás e aí entrou o Ricardo Ferraz com todo o conhecimento dele, ambiental. Ele fez uma pesquisa, por exemplo, sobre quantos automóveis passavam, qual impacto que causa, por exemplo, da fuligem, nas pinturas do prédio, e ele se utilizou conhecimento de grandes especialistas do Brasil na época; se produziu uma serie de relatórios, esses relatórios novamente eram manchetes no Brasil inteiro. (50:41)

“Jacareí apresenta estudo inédito de impacto da poluição sobre o acervo do museu e sobre o próprio prédio do século XIX”; pessoas ficaram encantadas e a partir disso muitos museus passaram a fazer esses estudos de impacto. Havia proposta de se pensar o anel viário respeitando o patrimônio desse prédio e daquela mancha urbana que tinha no centro da cidade. (51:20) A coisa ia sempre tomando uma dimensão maior.

P - Com relação às alcovas, você se lembra qual era a utilização delas antes; quando era ainda escola, quando vocês entraram no museu que ainda não tinha sido restaurado, aquele espaço das alcovas, você lembra o que era ali?

R - O quê era antes da gente...?

P - Antes do restauro do prédio. Eh... Naquele espaço, você lembra de alguma coisa ali... Existia? Ou tinham tirado as paredes e feito um corredor. O que eram as alcovas na configuração anterior?

R - O que eu sei é que no projeto, o quê estou lembrando agora é que no projeto de restauração se descobriu que houve uma alteração, que eles derrubaram algumas paredes e tal, não se sabia precisar exatamente o que era. E que depois eles recolocaram as paredes no (52:20) devido lugar. Isso eu lembro que eles fizeram, e foi uma coisa muito complicada porque tinha que mexer em algumas paredes que tinham pinturas então não podia ferir as pinturas então foi um processo bem complicado.

P - Mas era clara a existência daquelas alcovas ali, no período em que a casa era utilizada com residência?

R - Ah sim, através de introspecção na parede eles descobriram tudo isso. Tudo isso estava no projeto. Quer dizer essa utilização da casa, que eu lembro aqui, foi quando nós deixamos o museu. E que a idéia que tinha é isso, mas o projeto era... Mas a (53:06) idéia era, vamos continuar constituindo esse acervo. E que acervo é esse. Que acervo é importante? Essa era uma discussão permanente, permanente, permanente. Enquanto isso, acho que se desenvolveu paralelamente e é importante deixar muito claro, que agente tinha (53:19) uma preocupação, muito grande com a documentação histórica né? Aí agente já estava extrapolando, já não era só uma questão do museu. Ah, mas você pode perguntar, mas você poderia fazer um inventário. Essa história do inventário do patrimônio, ela vem surgir depois. Não havia isso, não havia essa concepção nem em Jacareí, nem em outra cidade. Hoje você vai desenvolver um projeto cultural um projeto de preservação numa cidade faz um inventário; você levanta tudo que tem, registra em que condições esta e aí você tem aquele documento mostrando um retrato. (53:40)xx.


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